sábado, 6 de março de 2010

Gótico
Por Beatrix Algrave - www.beatrix.pro.br
"É que cada um tem uma idéia própria , geralmente deturpada, da Idade Média. Só nós monges daquela época sabemos a verdade, mas, ao dizê-la podemos ser queimados vivos." - Umberto Eco
        O Gótico não é apenas uma opção de estética e sim uma mistura entre surrealismo, romantismo e estilo medieval. O Estilo Gótico tem origem nos Tempos Medievais, séculos XIII e XIV, ligado principalmente a arquitetura como catedrais e igrejas. O aparecimento do verdadeiro Estilo Gótico vem alguns anos a frente, onde a Época Medieval já era considerada um período bárbaro e obscuro, os bárbaros que lá viviam eram chamados de genos, portanto Gótico significa Bárbaros por excelência, causando assim um profundo desprezo.
        O gótico, portanto é aquele que cultiva a depressão, utiliza a música, a arte e a literatura para expressar suas decepções tanto amorosas quanto da vida, sua opinião sobre o mundo e sobre as coisas no qual ninguém se importa, ou ainda para criticar aquilo que tanto o incomoda.
        A literatura Gótica faz uma grande distinção entre o BEM e o MAL, onde Satã possue um grande papel. São muito citados nos textos góticos a noite, o pessimismo, a loucura, os sonhos, as sombras, as quedas, o medo, a decomposição, a atração pelo abismo, sem se esquecer da principal: a MORTE e a VIDA.
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Góticos: opções estésticas e definições
     Em primeiro lugar vamos as definições começando pelo sentido etimológico e histórico da palavra.
     O termo gótico têm sua origem ligado a um estilo de arte medieval presente entre os séculos XIII e XIV que sucedeu ao estilo românico (séculos XI e XII) fazendo-lhe oposição. Sua presença é marcante no que se refere principalmente a arquitetura, sendo famosas as catedrais que seguiram o seu padrão arquitetural como Notre-Dame de Paris, Chartres e Reims.
     O aparecimento do termo gótico entretanto encontra-se alguns anos a frente dessas construções medievais. Durantes os séculos em que foi moderna, a arte ótica era conhecida sob o nome de opus francigenarum, o que significa obra francesa e indica bem a sua principal origem. Entretanto nos séculos XV e XVI com a renascença e o entusiasmo pela antiguidade clássica, passou-se a considerar a Idade Média como uma época bárbara e obscura. Como os godos eram os bárbaros mais conhecidos, o estilo passou a se chamar gótico, ou seja, bárbaro por excelência, alcançando um sentido pejorativo e de profundo desprezo.
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O Romantismo e o resgate da estética medieval:
     "É que cada um tem uma idéia própria, geralmente deturpada, da Idade Média. Só nós monges daquela época sabemos a verdade, mas, ao dizê-la podemos ser queimados vivos."
     O movimento romântico que se fez presente no século XIX procurará romper com os valores do classismo que assim como o renascimento exaltava os valores estéticos da antiguidade clássica e o racionalismo. Ao afrontar esses padrões o romantismo faz uma espécie de reabilitação da Idade Média e do seu imaginário. Muitas obras românticas como por exemplo Notre-Dame de Paris de Vitor Hugo têm como cenário a Idade Média. Entretanto a visão dos românticos era extremamente idealizada.
     São ainda os românticos os responsáveis pelo surgimento do "gothic novel" ou "romam noir", normalmente ambientados em castelos sombrios e ambientes tenebrosos. O castelo de Otranto lançado em 1764 por Walpole é um celebre exemplo disso. A Gothic Novel utiliza o passado como cenografia, pretexto para a construção fabulística, para dar livre curso a imaginação. Walpole pode ser cosiderado o criador e precursor do "gothic novel", seu romance foi inovador rompendo com os padrões literários então vigentes, criando uma atmosfera repleta de personagens inverossímeis, terrores sobrenaturais e castelos arruinados. O estilo fez um tremendo sucesso, sendo copiado por vários autores, indo muito além do romantismo nas formas do conto fantástico, conto de terror e até a ficção científica.
     O verme romântico nasce ainda sob os trajes do herético do anjo caído, é o "maldito" por excelência, e isso não podemos perder de vista. Sob esta ótica o romantismo é ainda a reabilitação do mal, onde o mal se transforma em discurso noir, discurso de desconstrução moral que se perpetuará no século XX através do Dadaísmo e do Surrealismo.
     É no romantismo literário que se torna mais aparente e mais facilmente acessível para nós esse esforço sincrético para reintegrar no Bem o Mal e as trevas, herdando toda a dramatização da literatura bíblica e da iconografia medieval. Satã faz sua entrada triunfal como o Mefistófeles de Goethe, sendo o herói byroniano do Mistério de Caim. Faz-se a celebração da noite obscura, que passa a ser o lugar previlegiado da celebração dionisíaca tão presente na obra de Novalis ( Hinos à Noite). Acompanhando o resgate dos valores noturnos temos o pessimismo, a loucura, os sonhos, as sombras, a decomposição,a queda, a atração pelo abismo, a morte e a urgência pela vida.
     Esta inversão de valores é facilmente reconhecida nas obras de Vitor Hugo como Le Fin de Satan e a já citada Notre-Dame de Paris, onde a maldade e a feiúra tornam-se em ideal.
     O herói romântico traduz-se nas figuras do dândi e do libertino, imortalizados em vida e obra por Wilde, Byron e Sade.
     O romantismo abre espaço para o terror diabólico e ancestral nas obras de Poe, Le Fanu e Bram Stocker, surgindo da obra destes dois últimos a figura nefasta do vampiro, o amante imortal.
     No dark side do romantismo portanto, encontramos praticamente todos os elementos estéticos que tanto deliciam os góticos até os dias de hoje... Além da sua origem através do gothic novel.
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Amor aos vermes
     Claro que não é apenas no romantismo que os atuais góticos se nutrem, mas é na escola de morrer cedo que encontramos as suas referências mais preciosas, além da origem da atual acepção do termo. Todos os vermes na verdade tem a sua contribuição a dar, seja um Bosch entre a Idade Média e a renascença, um Byron romântico, um Dali surrealista, a degenerescência de um Fritz Lang, ou o cinismo caústico de um Wilde, pois onde quer que surja uma sociedade ordenada e racional, lá surgirá o verme delirante, receba ele o nome que for. E talvez seja este o princípio estético dos góticos, o amor aos vermes, não importa a linguagem
ou escola artística.
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Arquitetura e Escultura Cemiterial
     Apesar da aparência muitas vezes triste, os cemitérios, principalmente os mais antigos podem guardar ricas surpresas para quem se dispõe a procurar. Alguns constituem verdadeiras galerias de arte a céu aberto sendo até mesmo possível  encontrarmos peças e esculturas de artistas famosos. Em países como a França e Argentina alguns cemitérios são até mesmo pontos turísticos que atraem viajantes do mundo inteiro como por exemplo os Cemitérios de Pére Lachaise (Paris) e da Recoleta (Buenos Aires).
     Eles são concorridos pontos turísticos por terem entre seus moradores eternos figuras famosas que fizeram história nas artes ou na política. Mas com certeza a beleza da arte tumulária presente nestes cemitérios contribui e muita para a sua fama.
     No Brasil também encontramos exemplo magníficos de arte tumulária principlamente nos cemitérios de São Paulo como Consolação, Araçá, Paulista e Morumbi. Também existem importantes acervos de arte tumulária no Rio de Janeiro, na Bahia e em Recife. Entretanto ao contrário do que ocorre em outros países são poucos os que percorrem os cemitérios brasileiros para visitação de túmulos ilustres (com exceção do dia de finados) ou que saibam apreciar as obras de arte que estes cemitérios muitas vezes escondem. Muitos dos jazigos presentes nestes cemitérios foram feitos por artistas europeus e com materiais muitas vezes importados, tudo com o objetivo de enaltecer o nome das famílias abastadas. Em cemitérios como o da Consolação em São Paulo é possível encontrar obras de artistas consagrados como Brecheret e Luigi Brizzolara ao lado de outros não tão conhecidos como Eugênio Pratti e Ramando Zago. Muitos artistas italianos de renome deixaram um enorme acervo de peças espalhadas pelos cemitérios brasileiros, principalmente em São Paulo, e muitas destas peças só agora estão sendo identificadas. Para se ter uma idéia, somente no cemitério do Araçá existem cerca de 80 peças catalogadas, de notório valor artístico.
     O caráter individualizador do nome da família é uma das preocupações do imigrante europeu no Brasil, a partir da segunda metade do século XIX. Os cemitérios de Vila-Verde, Municipal de Curitiba, do Araçá e do Braz de São Paulo formam conjuntos de capelas jazigos familiares, recriando aquela atmosférica doméstica dos bairros tradicionais dos imigrantes. A comunidade representa-se, então , no todo do divisionismo e nos hábitos das famílias usuárias, que tratam de suas capelas como se fossem prolongamentos de suas próprias casas, levando para os jazigos os mesmos arranjos decorativos que o seu nível cultural lhes permite refletir. A preocupação do colono europeu na área de enriquecimento imediato era muito tendente a individualizar seu nome, através da exibição de sinais de abastança. O caráter monumental da última morada era para muitos fruto de uma ansiedade de se auto-afirmar socialmente.
     No estudo dos cemitérios brasileiros os estilos se sucedem como nas necrópoles européias, porém com datas defasadas e submetidos às razões da disponibilidade dos materiais locais. Há uma certa diferença entre os objetos produzidos no percurso da belle époque e os que surgiram logo após, de um estilo diferenciado, denominado art noveau. Nas principais metrópoles européias o início da art noveau tem data certa em 1890. O seu surgimento elege a máquina como instrumento de pluralização de produção artística, capacitada para atender o consumo da decoração doméstica, trajes, e objetos de uso cotidiano até o nível da pequena burguesia urbana. Os meios de lavor artístico adquirem soluções mecânicas com instrumental elétrico de muito maior rentabilidade de tempo e produção. Brocas serras e polidores elétricos, novos métodos de fundição e metalurgia possibilitam a reprodução de protótipos de objetos de criação artística, ao nível industrial.
     Em relação a arte cemiterial, tais possibilidades determinam, em todos os centros urbanos de expressão e riqueza, novas e reconhecíveis características. Até então as construções cemiteriais se valiam do trabalho artesanal e da eventualidade artística. Com o trabalho industrial mecanizado, as fundições passaram a fornecer gradis e portões, cercaduras de ornatos, frisos, cruzes e alegorias pré-moldadas, vigas metálicas, colunatas de estruturas , etc. A estatuária náo era mais trabalho do escultor, neste caso entendido como o artista criador do objeto modelado. Estatuário na linguagem do século passado, corresponde ao artesão habilitado a reproduzir em pedra os protótipos encomendados, mediante pantógrafo, brocas elétricas e produção em série.
     O traço que distingue a passagem da arte tumulária neoclassista para a da belle époque corresponde, em primeiro lugar à diminuição, e mesmo esvaziamento da simbologia escatológica tradicional. Estas eram freqüentes, quase obrigatórias na fabricação dos marmoristas de Lisboa, tanto na representação do objeto principal como na distribuição dos elementos alegóricos. A belle epoque se despe da excessiva carga escatológica e se realiza como uma nova espiritualidade lírica, procurando impregnar, até as próprias alegorias, com uma aparência de profundo realismo, de verismo. Por isso logo transforma a figura alada e assexuada dos anjos da estatuária classista, em novos personagens, em anjos de procissão que parecem existir em nosso cotidiano. Os anjos da belle époque ganham sexo, expressam a idade, brincam como crianças, refletem juventude, mas também sabem assumir quando querem traduzir desolação, as atitudes mais teatrais e melodramáticas.
     O romantismo das figuras da belle époque embora tenha uma apresentação realística não pode ser identificado com os sinais eróticos que se manifestariam depois na arte tumulária. São igualmente freqüentes na arte tumulária da belle époque sinais de referência e de simbolização de fortuna, do prestígio e da ropriedade. A presença de alegorias pagãs, como o símbolo do deus Mércurio (ou Hermes, do Comércio), além de outras figuras mitológicas como ninfas também é constante. A belle époque também não foi insensível ao enaltecimento dos produtos industrializados substituindo o bronze pelo ferro em muitas das esculturas.
   O final do século XIX e princípio do século XX foi extremamente rico para a arte cemiterial brasileira por reunir ao mesmo tempo famílias com recursos financeiros e disposição para construir túmulos suntuosos e artistas de grande talento que aqui aportaram, principalmente italianos. São desse período muitas das peças produzidas por Brecheret, de caráter modernista, além de outras peças que denotam sensualidade e monumentalidade, como a dos artistas Emendabili, Oliani e Nicola Muniz. Todos apresentando uma riqueza de detalhes e leveza surpreendentes. A presença de nus na arte cemiterial é uma grande inovação deste período.
     Nos cemitérios brasileiros não é tão fácil distinguir-se essa sucessão cronológica dos estilos, comparecendo a belle époque e art noveau muitas vezes como mercadorias importadas, imitadas, dispostas e acumuladas ao longo das quadras. Devido a disposição muitas vezes atrofiada de alguns cemitérios até mesmo observar as peças torna-se muitas vezes um grande sacrifício. Outro fator de prejuízo é sem dúvida a má conservação de muitas das necrópoles brasileiras, algumas centenárias e em estado de total abandono. Numa perda irreparável de um belo patrimônio artístico nacional. Hoje em dia, com o surgimento dos chamados cemitérios-jardim a arte da escultura cemiterial praticamente está extinta. Outro fator que leva a presença cada vez mais escassa de túmulos monumentais, é o alto custo dos materiais como o mármore, ferro e bronze, além da quase inexistência de artistas que se dediquem a este tipo de trabalho. Resta-nos portanto lutar para preservar esta verdadeiras obras de arte que ainda subsistem espalhadas pelos cemitérios brasileiros, começando por reconhecer o seu inestimável valor estético.
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Origem dos Cemitérios no Século XVII
"Esta a morte perfeita, nem lembranças, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso..." - Lygia Telles (Venha ver o pôr-do-sol)
     Aconteceu no mundo inteiro, um fenômeno curioso no final do século XVII. Por medida sanitária os sepultamentos passam a realizar-se em área aberta, nos chamados campos-santos ou cemitérios secularizados.
     Isto já não era novidade: japoneses, chineses, judeus e outros povos já traziam tradicionalizada a inumação a céu aberto. Os protestantes também, em muitos países o faziam. A mudança afetou principalmente os povos de predominância católica. No Brasil, o enterro fora da Igreja era reservado aos acatólicos, protestantes, judeus, muçulmanos, escravos e condenados, até que por lei, inspirada na correlação que se fez entre a transmissão de doenças através dos miasmas concentrados nas naves e criptas, se instalaram os campos de sepultamento ensolarados.
     Um outro motivo, que embora não diga respeito a realidade brasileira merece ser citado, diz respeito a laicização do Estado e sua separação da Igreja. Um exemplo digno de nota é o caso do Pére Lachaise de Paris (descrito melhor logo a seguir), que apesar de receber o nome de um padre católico, abriga tanto pessoas de várias religiões quanto não-religiosos, sendo um dos dos primeiros cemitérios laicos e também um dos mais famosos do mundo.
     A urbanização acelerada e o crescimento das cidades é também uma importante razão para a criação dos cemitérios coletivos a céu aberto, visto que o crescimento populacional desenfreado não permitia mais o sepultamento em capelas e igrejas, que já não comportavam o aumento da demanda.
     Numa primeira impressão o fato parece ter explicação simples, mas quando se atenta para o resultado ocorrido, sobre mais de um século, estudando-se o fantástico derrame de fortunas nas construções tumulárias pomposas, dos abastados de cada cidade, quando se verifica a diferença de comportamento entre a sepultura de igreja e a de construção livre arbitrada pela fantasia do usuário, e também quando se considera a história social e cultural do mesmo período, então se percebem outras razões no fenômeno. Não foi somente uma questão do ponto de vista higiênico, ou seja, uma razão metade prática e metade científica (e também política e social), da sociedade oitocentista. Se esta mudança acontecesse apenas por esse motivo, os cemitérios católicos em descampados teriam permanecido sóbrios e padronizados do mesmo modo que os erigidos por irmandades em mausoléus coletivos, ou como os de outras religiões.
     A simplicidade dos padrões tradicionais e primitivos continuou caracterizando a sepultura coletiva enquanto o fausto e a arrogância da tumulária individual se desenvolveu espantosamente.
     Portanto a verdadeira razão da grande mudança de atitude e gosto já existia há longos tempos no anseio de monumentalizar-se perante a comunidade. Era e sempre foi o desejo dos mais abastados, distinguir-se através de uma marca perene, de um objeto de consagração - o túmulo - pela atração de compara-se aos grandes personagens da história, sem a menor cerimônia, incluindo nesta leva os soberanos, os faraós, os reis, os papas e os príncipes, que mereceram sepulcros diferenciados dos demais.
    Há de fato túmulos monumentais de papas de acordo com a pompa de cada época, contudo sempre integrados à construção da igreja. Há papas que não restaram por virtudes, e sim pela eventualidade do valor artístico, ou monumental de seus túmulos. De qualquer modo, erigia-se a igreja como bem público, integrada ao uso coletivo, e nela se fazia a sepultura do seu doador e benfeitor.
     Entretanto em muitas igrejas, originalmente levantadas para serem o jazigo do doador, este descansa sob uma lápide que nem perturba o nível do chão. A arte tumulária varia com a data, acompanha cada estilo de época, e de região, e jamais sonega o caráter, a espiritualidade do meio em que ocorre. Sob tal prisma, isto é, tomando-se a arte tumulária como representativa desses atributos, podemos entender as estruturas sociais e culturais dos meios, mesmo quando tal se acha restrita a uma parcela da população. Aliás, tal restrição, relaciona-se diretamente com o tipo de economia da sociedade, estando deste modo a arte cemiterial condicionada a fatores de caráter sociológico, econômico e cultural.
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Pére Lachaise de Paris
     O grande cemitério de Pére Lachaise de Paris, fundado em 1804, precede em meio século os sepultamentos em cemitérios abertos decorrentes das leis e dos motivos sanitaristas, conforme ocorreu no Brasil.
O Pére Lachaise, que era um bosque, continuou a sê-lo e jamais perdeu o predomínio paisagístico. Suas sepulturas celebrizadas pelos nomes dos sepultados, vão desde a estela simples até a estatuária monumental e as capelas jazigo de enorme riqueza. Todavia, o distanciamento entre uma e outra, a topografia em aclive, as veredas até o fim da vista e os caminhos curvos arborizados permitem um percurso e uma compreensão de todas as datas, desde os túmulos góticos transladados até o da escultura expressionista de nossos tempos.
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Arquitetura Gótica
"Idade média, és a minha escura subjacência." - Clarice Lispector
     A maioria das pessoas quando houve a palavra "gótico", lembra logo das grandes e célebres catedrais medievais como Chartres, Reims e Notre-Dame de Paris. Mas será que isso teria alguma coisa a ver com as bandas européias de Gothic Rock como Siouxsie & The Banshees, Sisters of Mercy ou Bauhaus? Ao citarmos esta última em particular aí é que a coisa complica, afinal Bauhaus não era também uma escola de arquitetura criada em 1919 e fechada depois pelos nazistas?
     Para encontrar respostas a estas perguntas vamos por partes:
     Como já discutimos em outro tópico sobre a origem do termo gótico, existe sim uma relação com a arte gótica da Idade Média, mas filtrada pela reconstituição cultural que os românticos fizeram incorporando elementos da arte medieval em suas obras, como forma de contestar o classismo e seu apego a antiguidade clássica e ao racionalismo. No romântismo ao contrário havia um retorno idealizado em relação ao místico e ao imaginário medievais (elementos presentes também na arte barroca). E não há ícone melhor da Idade Média que a catedral gótica.
     Neste sentido duas obras românticas são fundamentais: Notre-Dame de Paris de Vitor Hugo, e o Castelo de Otranto de Walpole.
     Na obra de Vitor Hugo, a catedral torna-se o centro de toda a ação. O autor busca no passado histórico o rompimento com a estética clássica, elegendo o feio seu ideal de beleza, fazendo do disforme Quasímodo, o herói da história. Hugo considera ainda em seu romance a arte gótica como a verdadeira arte popular. Quanto a Walpole, é curioso notar que a idéia do romance se originou de um sonho e que posteriormente levou Walpole a construir um castelo gótico, o que acabou se tornando comum a época, em que vários dândis torraram fortunas na construção de castelos góticos medievais em pleno século XVIII.
     O castelo medieval era ainda o cenário privilegiado do roman noir, com seus calabouços, masmorras, fossos, imensas salas, corredores sombrios e passagens secretas. É no castelo, em noites de tempestades e lua cheia que se dá o clímax das gothic novels, como ficou conhecido o gênero.
     São resgatadas do cenário medieval personagens do imaginário cristão e popular, como o vampiro e porque não, Satã.
     O Drácula de Bran Stocker não é nada mais que o lendário conde Vlad Teps da Transilvânia que segundo consta teria vivido no século XVI, e que tanto deliciou a imaginação dos românticos do século XIX.
     Quanto a Satã, Goethe traduziu-o na figura de Mefistófeles, uma das personagens mais marcantes da literatura mundial. Todos os elementos estéticos, muitas vezes grotescos, que se encontram no roman noir ou gothic novel, tem no castelo e na catedral góticos a sua melhor inspiração e representação. E não é nenhum mistério que daí tenha saído a inspiração para 09 entre 10 bandas de Gothic Rock.
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Cinema Gótico
"Quando me perguntam de onde vem minhas idéias, respondo que se originam de meus próprios pesadelos, mesmo quando não estou dormindo.
Temos medo de tudo: do desconhecido, do abismo, da noite, das tempestades, da selva e dos desertos. Na hora de escrever, basta pensar que aquilo
que me assusta provavelmente também assusta os outros. Em algum lugar dentro de nós existe uma chave que acende o medo; é aí onde se instala o
conto de terror, quando está bem escrito, pois o homem sente mais atração por monstros e dragões do que por heróis. Como é impossível estar sempre lutando contra nossos próprios demônios e males, de vez em quando sentimos necessidade de levá-los para passear." - Stephen King.
     A sétima arte está repleta de obras-primas do gênero terror-suspense, filmes que de uma forma ou de outra expressam e exibem a face obscura e irracional da imaginação humana.
     O porquê nos sentimos atraídos e fascinados pelo horror até hoje é um mistério. Os filmes de terror nasceram praticamente junto com a cinematografia. O primeiro filme do gênero surgiu em 1896 e chamava-se Escamotage d'Une Dame Chez Robert Houdin, e em 1912 veio A conquista do pólo no qual um expedicionário era devorado pelo abominável homem das neves. Passando por clássicos como O gabinete do Dr. Caligari de Weine e Nosferatu de Murnau, até o sádico Freddy Krueger nos anos 80, o gênero é um dos mais prolíficos já inventados.
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Literatura Gótica
     Quem pensa que a lista de autores cultados pelos góticos se resume a trilogia Poe-Baudelaire-Byron, está profundamente enganado. No terreno da literatura as influências são as mais variadas possíveis englobando românticos, surrealistas, beatnicks, expressionistas, modernistas, dadaístas e coisas que vão além da nossa imaginação.
     Tudo começou com sir Horace Walpole e seu livro O castelo de Otranto lançado em 1764. Este livro discordava radicalmente dos padrões então vigentes. Sua atmosfera estava repleta de fantasmas, passagens secretas, terrores sobrenaturais e inverossímeis. Estava assim inaugurado o roman noir. O roman noir ou gothic novel, surgido durante o romantismo é mais uma atmosfera literária do que um estilo ou escola propriamente dita. Eis o porque deste gênero espalhar-se por outros estilos literários além do romantismo, rompendo todas as fronteiras da literatura. O conto de terror, o conto fantástico e a ficção científica podem ser considerados seus herdeiros diretos, garantindo ao gênero gótico uma extrema vitalidade até os dias de hoje. Aqui estão portanto citadas as pincipais obras da literatura gótica, romântica,fantástica e de terror. Esta pequena seleção bibliográfica está aberta a sugestões e inclusões. Alguns livros trazem resenha, para vê-la basta clicar sobre o título. É possível igualmente ver a biografia de alguns autores, bastando clicar sobre os nomes. Também fiz questão de incluir autores nacionais que de alguma forma se afinam ou sofrem influência da estética gótica.
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Aldous Huxley, "Admirável Mundo Novo"
Apuleio, "O burro de ouro"
Álvarez de Azevedo, "Noite na Taverna", "Macario"
Ann Radcliffe, "Os castelos de Athlin e Dunbayne", "O italiano", "O confessionários dos penitentes negros"
Anne Ricce, "Entrevista com o vampiro"
Anthony Burgess, "Laranja mecânica"
Arthur conan Doyle, "Um estudo em vermelho" e "O cão dos Baskerville"
Arthur Rimbaud, "Uma temporada no inferno"
Augusto Carvalho Rodriguez dos Anjos, "Eu"
Bram Stoker, "Drácula"
Bryon, "Poesias", "Horas de Ócio", "Don Juan"
Cecília Meireles, "Cânticos", "Crônicas de Viagem" e "Espectros"
Chamisso, Hoffmann, Gogol, Andersen, "Contos dos homens sem sombra" (Coletânia)
Charles Baudelaire, "Flores do mal", "Paraísos Artificiais"
Charles Dickens, "David Copperfield", "O abismo"
Charles Maturin, "Melmoth. O viandante"
Charles Nodier, "Smarra; ou, Os demônios da noite"
Clarice Lispector, "A paixão segundo G.H.", "Perto docoração selvagem", "Laços de família", e todos os outros
Daniel Defoe, "Contos de Fantasmas", "Um diário do ano da peste"
Dante Allighiere, "A divina comédia"
Diderot, "A religiosa"
Donna Tart, "A histó secreta"
Edgar Allan Poe, "O corvo" (poema), "Histórias Extraordinárias"
Emily Bronte, "O morro dos ventos uivantes"
Ernst Theodor Amadeus Hoffmann, "Contos fantásticos", "O pequeno Zacarias chamado Cinábrio", "Contos sinistros", "Irmã Mônica"
Eurípedes, "Medéia"
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Música Gótica
Gothic Music: O lado obscuro do pós-punk.
     No final dos anos 70 e início dos anos 80, a raiva e a agressividde que incendiavam o movimento punk começam a ceder lugar a uma profunda depressão e um sentimento de insatisação de um lado e falta de perspectiva do outro. Na Inglaterra, Margareth Tatcher assume o poder, triplica-se o desemprego e aumenta a inflação. Este é o cenário triste da chamada década perdida.
     Nas paradas musicais domina a pose, o glamour do pop inglês e da dance music com seus artistas poseurs e cintilantes.
     Entretanto algo estava para acontecer em uma cidadezinha chamada Manchester, onde havia muita gente morando em subúrbios cinzentos recusando-se a enterrar o legado punk, e achando que aquele pop poseur tinha muito pouco a ver com a vida real na Inglaterra.
     E é na mesma Manchester que surge o porta voz ideal destes angustiados de quarto, na figura de Ian Curtis, um dos primeiros a transformar toda essa melancolia e desilusão em música, através da sua banda Joy Division, que apesar da curta duração devido ao suicídio de Ian, seu vocalista, deixou como legado o rock mais melancólico e desesperado já feito. Sendo uma das bandas mais representativas do movimento pós-punk, como ficou conhecido este substilo musical do rock, que apresentava elementos musicais do punk mas com uma dose de melancolia mais acentuada. E é dentro do pós-punk que encontramos as mais representativas bandas do chamado estilo gótico, que no Brasil também foi chamado de dark, devido a preferência por roupas pretas de seus adeptos.
     É nos anos 80 que a morte será o tema mais recorrente nas canções pop, sendo igualmente comuns temas como melancolia, desespero, abandono, decepções amorosas e falta de perspectivas. Estes temas estarão presentes nas músicas de um certo grupo suburbano de Crowley, Sussex, Inglaterra; chamado The Cure, cujo vocalista Robert Smith com seu jeito soluçante de cantar, cabelos desgrenhados e olhos pintados de preto, fez a alegria dos cultuadores de "deprê" em canções como One hundred years, The hanging garden e Siamese Twins, atingindo seu climax "noir" no disco Pornography de 1982.
     Entretanto a cristalização do gótico em quanto gênero esteve a cargo de um quarteto de Northampton (Inglaterra), que em seu primeiro single desfia loas a um tal Bela Lugosi, famoso vampiro dos anos 30, e cujo vocalista Peter Murphy delirava pesadelos com sua voz soturna sob um baixo pesadão e efeitos macabros de guitarra; falando de temas como morte, vampiros, morcegos e rituais pagãos.
     A voz igualmente soturna de Andrew Aldritch foi o selo definitivo de movimento gótico, sendo seu grupo, The Sister of Mercy considerado, com toda razão, o maior representante do gênero. Não se pode também esquecer as musas, pra ser mais exato duas musas, madrinhas, divas e rainhas máximas do gótico: Siouxsie Sioux e Anja Howe.
     Comecemos por Siouxsie Sioux, a Bruxa madrinha de uma geração de cabelos arrepiantes, com seu estilo misto de diva dos anos 20 e de prostituta nos seus belos olhos extremamente maquiados. Siouxsie e seus banshees eram majestades únicas do reinado gótico. Guitarras distorcidas, batida tribal, harmonias fluidas e climas mórbidos se traduziam em pérolas como A Kiss in the Dreamhouse, Kaleidoscope e Nocturne. Siouxsie também foi uma das primeiras cantoras a liderar uma banda mais pesada. Nascidos no movimento punk, Siouxsie & The Banshees souberam fazer a perfeita transição para o gótico, sendo um dos precursores do estilo.
     Quanto a sua majestade loira, Anja Howe, a vocalista da banda underground alemã X-Mal Deutschland, pode ser considerada pioneira do estilo gótico na terra de Goethe. Com sua voz inconfundível cheia de alalaôs e anomatopéias, acompanhada de guitarras e baixo linha serra elétrica. Eram também comuns na banda, o uso de recursos eletrônicos, criando sons viajantes que mesclados ao vocal sedutor, criavam texturas delirantes num perfeito clímax lírico-depressivo; levando os mortos vivos à loucura através de obras primas como Incubus Succubus, Tocsin e a maravilhosa Matador.
     Seria ainda uma grande injustiça deixar de citar outras bandas igualmente seminais do estilo Gothic e do Darkwave como Clan of Xymox, The Mission, Opera Multi Steel, Poesie Noire, Cult, Switchblade Symphony, Love is Colder than Death... Bem são tantas que fica até difícil citar todas, em mais uma prova do quanto o estilo é prolífico.
     No finalzinho da segunda metade da década de 1980, porém, o clima começa a tornar-se inóspito para morcegões e afiliados, e o estilo gótico começa a entrar em decadência, significando o fim de muitos grupos que consagraram o gênero, deixando orfãos e famintos de sangue muitos nosferatus, e fazendo as noites enevoadas de Londres (e porque não as noites garoentas de São Paulo) perder muito de seu charme.

Degeneração da degeneração:
     No finalzinho dos anos 90 e começo de 2000, surgem bandas de heavy metal que vêem no rock gótico matéria-prima para uma reciclagem e renovação do estilo. Os adeptos do new-metal como o Cradle of Filth (que se denomina black gothic romantic metal), ou do sub gênero Doom tornam a fazer uma parte dos góticos sorrirem de felicidade, e outra parte virar a cara de desprezo.
     Resta saber quem tem razão, pois só o tempo dirá, se este renascimento do gótico (se é que ele chegou mesmo a morrer), representará a sua volta e consagração, ou se eregirá o seu definitivo epitáfio... ou talvez nenhuma das alternativas anteriores. Contudo uma coisa é certa. Bela Lugosi's still waiting...
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Pintura Gótica
"Beleza é terror. O que chamamos de belo nos faz tremer. A beleza é áspera e se parece com um extermínio. Ainda assim, é tudo que se quer." - Donna Tartt (A história Secreta)
"O horrível é belo, o belo é horrível." - Shakespeare (Macbeth)
     No campo da pintura a influência da arte medieval especialmente do estilo românico e gótico (ao contrário do que foi dito em relação à arquitetura) praticamente não se faz sentir.
     A presença da figura humana extremamente estilizada, o plano bidimensional que caracteriza o estilo, tem muito pouco a ver com os elementos iconográficos reverenciados atualmente pela tribo dark ou gótica. A exceção talvez fique por conta das obras de Giotto, sendo este pintor um dos precursores do rompimento com a tradição bizantina; ao dar um tratamento tridimensional às suas obras.
     Quanto aos elementos simbólicos da arte medieval, de imaginário fortemente místico, este sim traria alguma influência, principalmente no que se refere ao rico bestiário medieval, ilustrado em especial nas iluminuras que costumavam ornar livros e manuscritos da época e também nos elementos decorativos de palácios e igrejas.
     A arte renascentista ao contrário traz uma grande contribuição, presente principalmente nas obras de Hieronymus Bosch, Pieter Bruegel e Dürer. Artistas de apurada técnica e imaginação fértil. O flamengo Bosch demonstra isto muito bem, em sua obra: O jardim das delícias, no triplo painel onde representam-se o paraíso terrestre, o paraíso celestial e o inferno. Uma obra complexa povoada de pequenas figuras e criaturas imaginárias. Bosch seria na concepção de muitos estudiosos da arte, um surrealista antecipado.
     Igualmente há influência estética na Arte Barroca que combinava movimentos energéticos, cores intensas e detalhes decorativos com expressiva originalidade e liberdade. O imaginário barroco é extremamente poderoso, expresso em; gestos, fundos sombreados e uso dramático da luz e sombra. As obras apresentam muitas vezes um caráter sombrio, pungente e dramático.
     Destaca-se neste estilo artistas como Caravaggio, que em suas obras (principalmente as iniciais) celebrou personagens mundanas e sexualmente ambíguas, além de representar figuras religiosas como simples mortais. Um escândalo para a época.
     Outro destaque vai para Jan Vermeer, que possuia uma refinada técnica em trabalhar efeitos de luz e figuras geométricas em seus quadros, como o célebre A rendeira; que tanto excitou a imaginação tresloucada de Dali. Não se pode ainda esquecer um mestre como Rembrandt, que sabia como nenhum outro combinar dramáticos efeitos de luz com sutis efeitos ilusórios, num quase abstracionismo.
     Apesar de todos estes estilos e artistas da pintura terem influenciado na estética dos darks ou góticos, nenhuma desses escolas se compara em importância ao Expressionismo, Surrealismo e Modernismo, todas as artes contestadoras e revolucionárias.
    Comecemos pelo Expressionismo, a arte do instinto, com sua pintura dramática e subjetiva. É um estilo explosivo, errático, que se fez presente também na literatura, no teatro, na dança e no cinema.
     Edvard Munch e Van Gogh podem ser considerados artístas ícones do Expresssionismo.
     Van Gogh é um artista fundamental do gênero, sua obra apresenta uma explosão de cores intensas e puras, e a presença de formas sinuosas que expressam a energia e a dramaticidade de uma alma atormentada.
     O norueguês Edvard Munch, considerado um dos pintores mais radicais e talentosos de sua geração, demonstrou em obras como O Grito, um trabalho inquietante onde a representação pictórica sucumbe às fortes emoções, a tensão e a ansiedade do desepero. Nesta obra em particular; é como se todo o cenário em volta da personagem participasse da excitação aterradora do grito, expressando toda a angústia envolvida na cena.
     Outra influência importante é Goya, em sua obra rica de representações misógenas e diabólicas, onde aparecem velhas decrépitas e ameaçadoras, além de feiticeiras que veneram o grande Bode e preparam pratos abomináveis.
     Quanto ao Surrealismo, que acima de tudo foi um movimento revolucionário, temos igualmente manifestações não só na pintura, mas também na literatura e no cinema.
     O Surrealismo é uma forma de expressão, instintiva, irracional, cuja arma principal era o escândalo. "Seu objetivo principal não era criar um novo movimento pictórico, literário ou até filosófico, mas sim fazer explodir a sociedade, mudar a vida" - (Buñuel).
     Entre os artistas que mais se destacaram neste movimento na pintura estão: Picasso e Dali.
     Picasso e Dali guardam uma certa semelhança pela fixação que possuiam em relação a mulher (Picasso-Dora Marr, Dali-Gala).
     Picasso soube expressar como ninguém o delírio e a monstruosidade da guerra. Em sua obra mais conhecida, Guernica aparecem rostos hediondos, torturados e abjectos, que são na verdade os próprios rostos da guerra e da desgraça provocada pelos nazistas, e eram eles mesmos que atribuiam a obra do próprio Picasso e de outros artistas surrealistas o título de: artistas degenerados.
     Dali foi um dos artistas mais delirantes de seu tempo, possuindo uma imaginação fértil, obcessiva e irracional. Criador do método paranóico-crítico, de um estilo e vida exibicionista, nem sua fase Avida Dollars foi capaz de ofuscar sua obra. Poderia ainda citar outras obras, artistas e gêneros, mas prefiro deixá-los com esta pequena amostra da influência da pintura na estética dark.

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sábado, 6 de março de 2010

Gótico
Por Beatrix Algrave - www.beatrix.pro.br
"É que cada um tem uma idéia própria , geralmente deturpada, da Idade Média. Só nós monges daquela época sabemos a verdade, mas, ao dizê-la podemos ser queimados vivos." - Umberto Eco
        O Gótico não é apenas uma opção de estética e sim uma mistura entre surrealismo, romantismo e estilo medieval. O Estilo Gótico tem origem nos Tempos Medievais, séculos XIII e XIV, ligado principalmente a arquitetura como catedrais e igrejas. O aparecimento do verdadeiro Estilo Gótico vem alguns anos a frente, onde a Época Medieval já era considerada um período bárbaro e obscuro, os bárbaros que lá viviam eram chamados de genos, portanto Gótico significa Bárbaros por excelência, causando assim um profundo desprezo.
        O gótico, portanto é aquele que cultiva a depressão, utiliza a música, a arte e a literatura para expressar suas decepções tanto amorosas quanto da vida, sua opinião sobre o mundo e sobre as coisas no qual ninguém se importa, ou ainda para criticar aquilo que tanto o incomoda.
        A literatura Gótica faz uma grande distinção entre o BEM e o MAL, onde Satã possue um grande papel. São muito citados nos textos góticos a noite, o pessimismo, a loucura, os sonhos, as sombras, as quedas, o medo, a decomposição, a atração pelo abismo, sem se esquecer da principal: a MORTE e a VIDA.
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Góticos: opções estésticas e definições
     Em primeiro lugar vamos as definições começando pelo sentido etimológico e histórico da palavra.
     O termo gótico têm sua origem ligado a um estilo de arte medieval presente entre os séculos XIII e XIV que sucedeu ao estilo românico (séculos XI e XII) fazendo-lhe oposição. Sua presença é marcante no que se refere principalmente a arquitetura, sendo famosas as catedrais que seguiram o seu padrão arquitetural como Notre-Dame de Paris, Chartres e Reims.
     O aparecimento do termo gótico entretanto encontra-se alguns anos a frente dessas construções medievais. Durantes os séculos em que foi moderna, a arte ótica era conhecida sob o nome de opus francigenarum, o que significa obra francesa e indica bem a sua principal origem. Entretanto nos séculos XV e XVI com a renascença e o entusiasmo pela antiguidade clássica, passou-se a considerar a Idade Média como uma época bárbara e obscura. Como os godos eram os bárbaros mais conhecidos, o estilo passou a se chamar gótico, ou seja, bárbaro por excelência, alcançando um sentido pejorativo e de profundo desprezo.
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O Romantismo e o resgate da estética medieval:
     "É que cada um tem uma idéia própria, geralmente deturpada, da Idade Média. Só nós monges daquela época sabemos a verdade, mas, ao dizê-la podemos ser queimados vivos."
     O movimento romântico que se fez presente no século XIX procurará romper com os valores do classismo que assim como o renascimento exaltava os valores estéticos da antiguidade clássica e o racionalismo. Ao afrontar esses padrões o romantismo faz uma espécie de reabilitação da Idade Média e do seu imaginário. Muitas obras românticas como por exemplo Notre-Dame de Paris de Vitor Hugo têm como cenário a Idade Média. Entretanto a visão dos românticos era extremamente idealizada.
     São ainda os românticos os responsáveis pelo surgimento do "gothic novel" ou "romam noir", normalmente ambientados em castelos sombrios e ambientes tenebrosos. O castelo de Otranto lançado em 1764 por Walpole é um celebre exemplo disso. A Gothic Novel utiliza o passado como cenografia, pretexto para a construção fabulística, para dar livre curso a imaginação. Walpole pode ser cosiderado o criador e precursor do "gothic novel", seu romance foi inovador rompendo com os padrões literários então vigentes, criando uma atmosfera repleta de personagens inverossímeis, terrores sobrenaturais e castelos arruinados. O estilo fez um tremendo sucesso, sendo copiado por vários autores, indo muito além do romantismo nas formas do conto fantástico, conto de terror e até a ficção científica.
     O verme romântico nasce ainda sob os trajes do herético do anjo caído, é o "maldito" por excelência, e isso não podemos perder de vista. Sob esta ótica o romantismo é ainda a reabilitação do mal, onde o mal se transforma em discurso noir, discurso de desconstrução moral que se perpetuará no século XX através do Dadaísmo e do Surrealismo.
     É no romantismo literário que se torna mais aparente e mais facilmente acessível para nós esse esforço sincrético para reintegrar no Bem o Mal e as trevas, herdando toda a dramatização da literatura bíblica e da iconografia medieval. Satã faz sua entrada triunfal como o Mefistófeles de Goethe, sendo o herói byroniano do Mistério de Caim. Faz-se a celebração da noite obscura, que passa a ser o lugar previlegiado da celebração dionisíaca tão presente na obra de Novalis ( Hinos à Noite). Acompanhando o resgate dos valores noturnos temos o pessimismo, a loucura, os sonhos, as sombras, a decomposição,a queda, a atração pelo abismo, a morte e a urgência pela vida.
     Esta inversão de valores é facilmente reconhecida nas obras de Vitor Hugo como Le Fin de Satan e a já citada Notre-Dame de Paris, onde a maldade e a feiúra tornam-se em ideal.
     O herói romântico traduz-se nas figuras do dândi e do libertino, imortalizados em vida e obra por Wilde, Byron e Sade.
     O romantismo abre espaço para o terror diabólico e ancestral nas obras de Poe, Le Fanu e Bram Stocker, surgindo da obra destes dois últimos a figura nefasta do vampiro, o amante imortal.
     No dark side do romantismo portanto, encontramos praticamente todos os elementos estéticos que tanto deliciam os góticos até os dias de hoje... Além da sua origem através do gothic novel.
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Amor aos vermes
     Claro que não é apenas no romantismo que os atuais góticos se nutrem, mas é na escola de morrer cedo que encontramos as suas referências mais preciosas, além da origem da atual acepção do termo. Todos os vermes na verdade tem a sua contribuição a dar, seja um Bosch entre a Idade Média e a renascença, um Byron romântico, um Dali surrealista, a degenerescência de um Fritz Lang, ou o cinismo caústico de um Wilde, pois onde quer que surja uma sociedade ordenada e racional, lá surgirá o verme delirante, receba ele o nome que for. E talvez seja este o princípio estético dos góticos, o amor aos vermes, não importa a linguagem
ou escola artística.
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Arquitetura e Escultura Cemiterial
     Apesar da aparência muitas vezes triste, os cemitérios, principalmente os mais antigos podem guardar ricas surpresas para quem se dispõe a procurar. Alguns constituem verdadeiras galerias de arte a céu aberto sendo até mesmo possível  encontrarmos peças e esculturas de artistas famosos. Em países como a França e Argentina alguns cemitérios são até mesmo pontos turísticos que atraem viajantes do mundo inteiro como por exemplo os Cemitérios de Pére Lachaise (Paris) e da Recoleta (Buenos Aires).
     Eles são concorridos pontos turísticos por terem entre seus moradores eternos figuras famosas que fizeram história nas artes ou na política. Mas com certeza a beleza da arte tumulária presente nestes cemitérios contribui e muita para a sua fama.
     No Brasil também encontramos exemplo magníficos de arte tumulária principlamente nos cemitérios de São Paulo como Consolação, Araçá, Paulista e Morumbi. Também existem importantes acervos de arte tumulária no Rio de Janeiro, na Bahia e em Recife. Entretanto ao contrário do que ocorre em outros países são poucos os que percorrem os cemitérios brasileiros para visitação de túmulos ilustres (com exceção do dia de finados) ou que saibam apreciar as obras de arte que estes cemitérios muitas vezes escondem. Muitos dos jazigos presentes nestes cemitérios foram feitos por artistas europeus e com materiais muitas vezes importados, tudo com o objetivo de enaltecer o nome das famílias abastadas. Em cemitérios como o da Consolação em São Paulo é possível encontrar obras de artistas consagrados como Brecheret e Luigi Brizzolara ao lado de outros não tão conhecidos como Eugênio Pratti e Ramando Zago. Muitos artistas italianos de renome deixaram um enorme acervo de peças espalhadas pelos cemitérios brasileiros, principalmente em São Paulo, e muitas destas peças só agora estão sendo identificadas. Para se ter uma idéia, somente no cemitério do Araçá existem cerca de 80 peças catalogadas, de notório valor artístico.
     O caráter individualizador do nome da família é uma das preocupações do imigrante europeu no Brasil, a partir da segunda metade do século XIX. Os cemitérios de Vila-Verde, Municipal de Curitiba, do Araçá e do Braz de São Paulo formam conjuntos de capelas jazigos familiares, recriando aquela atmosférica doméstica dos bairros tradicionais dos imigrantes. A comunidade representa-se, então , no todo do divisionismo e nos hábitos das famílias usuárias, que tratam de suas capelas como se fossem prolongamentos de suas próprias casas, levando para os jazigos os mesmos arranjos decorativos que o seu nível cultural lhes permite refletir. A preocupação do colono europeu na área de enriquecimento imediato era muito tendente a individualizar seu nome, através da exibição de sinais de abastança. O caráter monumental da última morada era para muitos fruto de uma ansiedade de se auto-afirmar socialmente.
     No estudo dos cemitérios brasileiros os estilos se sucedem como nas necrópoles européias, porém com datas defasadas e submetidos às razões da disponibilidade dos materiais locais. Há uma certa diferença entre os objetos produzidos no percurso da belle époque e os que surgiram logo após, de um estilo diferenciado, denominado art noveau. Nas principais metrópoles européias o início da art noveau tem data certa em 1890. O seu surgimento elege a máquina como instrumento de pluralização de produção artística, capacitada para atender o consumo da decoração doméstica, trajes, e objetos de uso cotidiano até o nível da pequena burguesia urbana. Os meios de lavor artístico adquirem soluções mecânicas com instrumental elétrico de muito maior rentabilidade de tempo e produção. Brocas serras e polidores elétricos, novos métodos de fundição e metalurgia possibilitam a reprodução de protótipos de objetos de criação artística, ao nível industrial.
     Em relação a arte cemiterial, tais possibilidades determinam, em todos os centros urbanos de expressão e riqueza, novas e reconhecíveis características. Até então as construções cemiteriais se valiam do trabalho artesanal e da eventualidade artística. Com o trabalho industrial mecanizado, as fundições passaram a fornecer gradis e portões, cercaduras de ornatos, frisos, cruzes e alegorias pré-moldadas, vigas metálicas, colunatas de estruturas , etc. A estatuária náo era mais trabalho do escultor, neste caso entendido como o artista criador do objeto modelado. Estatuário na linguagem do século passado, corresponde ao artesão habilitado a reproduzir em pedra os protótipos encomendados, mediante pantógrafo, brocas elétricas e produção em série.
     O traço que distingue a passagem da arte tumulária neoclassista para a da belle époque corresponde, em primeiro lugar à diminuição, e mesmo esvaziamento da simbologia escatológica tradicional. Estas eram freqüentes, quase obrigatórias na fabricação dos marmoristas de Lisboa, tanto na representação do objeto principal como na distribuição dos elementos alegóricos. A belle epoque se despe da excessiva carga escatológica e se realiza como uma nova espiritualidade lírica, procurando impregnar, até as próprias alegorias, com uma aparência de profundo realismo, de verismo. Por isso logo transforma a figura alada e assexuada dos anjos da estatuária classista, em novos personagens, em anjos de procissão que parecem existir em nosso cotidiano. Os anjos da belle époque ganham sexo, expressam a idade, brincam como crianças, refletem juventude, mas também sabem assumir quando querem traduzir desolação, as atitudes mais teatrais e melodramáticas.
     O romantismo das figuras da belle époque embora tenha uma apresentação realística não pode ser identificado com os sinais eróticos que se manifestariam depois na arte tumulária. São igualmente freqüentes na arte tumulária da belle époque sinais de referência e de simbolização de fortuna, do prestígio e da ropriedade. A presença de alegorias pagãs, como o símbolo do deus Mércurio (ou Hermes, do Comércio), além de outras figuras mitológicas como ninfas também é constante. A belle époque também não foi insensível ao enaltecimento dos produtos industrializados substituindo o bronze pelo ferro em muitas das esculturas.
   O final do século XIX e princípio do século XX foi extremamente rico para a arte cemiterial brasileira por reunir ao mesmo tempo famílias com recursos financeiros e disposição para construir túmulos suntuosos e artistas de grande talento que aqui aportaram, principalmente italianos. São desse período muitas das peças produzidas por Brecheret, de caráter modernista, além de outras peças que denotam sensualidade e monumentalidade, como a dos artistas Emendabili, Oliani e Nicola Muniz. Todos apresentando uma riqueza de detalhes e leveza surpreendentes. A presença de nus na arte cemiterial é uma grande inovação deste período.
     Nos cemitérios brasileiros não é tão fácil distinguir-se essa sucessão cronológica dos estilos, comparecendo a belle époque e art noveau muitas vezes como mercadorias importadas, imitadas, dispostas e acumuladas ao longo das quadras. Devido a disposição muitas vezes atrofiada de alguns cemitérios até mesmo observar as peças torna-se muitas vezes um grande sacrifício. Outro fator de prejuízo é sem dúvida a má conservação de muitas das necrópoles brasileiras, algumas centenárias e em estado de total abandono. Numa perda irreparável de um belo patrimônio artístico nacional. Hoje em dia, com o surgimento dos chamados cemitérios-jardim a arte da escultura cemiterial praticamente está extinta. Outro fator que leva a presença cada vez mais escassa de túmulos monumentais, é o alto custo dos materiais como o mármore, ferro e bronze, além da quase inexistência de artistas que se dediquem a este tipo de trabalho. Resta-nos portanto lutar para preservar esta verdadeiras obras de arte que ainda subsistem espalhadas pelos cemitérios brasileiros, começando por reconhecer o seu inestimável valor estético.
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Origem dos Cemitérios no Século XVII
"Esta a morte perfeita, nem lembranças, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso..." - Lygia Telles (Venha ver o pôr-do-sol)
     Aconteceu no mundo inteiro, um fenômeno curioso no final do século XVII. Por medida sanitária os sepultamentos passam a realizar-se em área aberta, nos chamados campos-santos ou cemitérios secularizados.
     Isto já não era novidade: japoneses, chineses, judeus e outros povos já traziam tradicionalizada a inumação a céu aberto. Os protestantes também, em muitos países o faziam. A mudança afetou principalmente os povos de predominância católica. No Brasil, o enterro fora da Igreja era reservado aos acatólicos, protestantes, judeus, muçulmanos, escravos e condenados, até que por lei, inspirada na correlação que se fez entre a transmissão de doenças através dos miasmas concentrados nas naves e criptas, se instalaram os campos de sepultamento ensolarados.
     Um outro motivo, que embora não diga respeito a realidade brasileira merece ser citado, diz respeito a laicização do Estado e sua separação da Igreja. Um exemplo digno de nota é o caso do Pére Lachaise de Paris (descrito melhor logo a seguir), que apesar de receber o nome de um padre católico, abriga tanto pessoas de várias religiões quanto não-religiosos, sendo um dos dos primeiros cemitérios laicos e também um dos mais famosos do mundo.
     A urbanização acelerada e o crescimento das cidades é também uma importante razão para a criação dos cemitérios coletivos a céu aberto, visto que o crescimento populacional desenfreado não permitia mais o sepultamento em capelas e igrejas, que já não comportavam o aumento da demanda.
     Numa primeira impressão o fato parece ter explicação simples, mas quando se atenta para o resultado ocorrido, sobre mais de um século, estudando-se o fantástico derrame de fortunas nas construções tumulárias pomposas, dos abastados de cada cidade, quando se verifica a diferença de comportamento entre a sepultura de igreja e a de construção livre arbitrada pela fantasia do usuário, e também quando se considera a história social e cultural do mesmo período, então se percebem outras razões no fenômeno. Não foi somente uma questão do ponto de vista higiênico, ou seja, uma razão metade prática e metade científica (e também política e social), da sociedade oitocentista. Se esta mudança acontecesse apenas por esse motivo, os cemitérios católicos em descampados teriam permanecido sóbrios e padronizados do mesmo modo que os erigidos por irmandades em mausoléus coletivos, ou como os de outras religiões.
     A simplicidade dos padrões tradicionais e primitivos continuou caracterizando a sepultura coletiva enquanto o fausto e a arrogância da tumulária individual se desenvolveu espantosamente.
     Portanto a verdadeira razão da grande mudança de atitude e gosto já existia há longos tempos no anseio de monumentalizar-se perante a comunidade. Era e sempre foi o desejo dos mais abastados, distinguir-se através de uma marca perene, de um objeto de consagração - o túmulo - pela atração de compara-se aos grandes personagens da história, sem a menor cerimônia, incluindo nesta leva os soberanos, os faraós, os reis, os papas e os príncipes, que mereceram sepulcros diferenciados dos demais.
    Há de fato túmulos monumentais de papas de acordo com a pompa de cada época, contudo sempre integrados à construção da igreja. Há papas que não restaram por virtudes, e sim pela eventualidade do valor artístico, ou monumental de seus túmulos. De qualquer modo, erigia-se a igreja como bem público, integrada ao uso coletivo, e nela se fazia a sepultura do seu doador e benfeitor.
     Entretanto em muitas igrejas, originalmente levantadas para serem o jazigo do doador, este descansa sob uma lápide que nem perturba o nível do chão. A arte tumulária varia com a data, acompanha cada estilo de época, e de região, e jamais sonega o caráter, a espiritualidade do meio em que ocorre. Sob tal prisma, isto é, tomando-se a arte tumulária como representativa desses atributos, podemos entender as estruturas sociais e culturais dos meios, mesmo quando tal se acha restrita a uma parcela da população. Aliás, tal restrição, relaciona-se diretamente com o tipo de economia da sociedade, estando deste modo a arte cemiterial condicionada a fatores de caráter sociológico, econômico e cultural.
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Pére Lachaise de Paris
     O grande cemitério de Pére Lachaise de Paris, fundado em 1804, precede em meio século os sepultamentos em cemitérios abertos decorrentes das leis e dos motivos sanitaristas, conforme ocorreu no Brasil.
O Pére Lachaise, que era um bosque, continuou a sê-lo e jamais perdeu o predomínio paisagístico. Suas sepulturas celebrizadas pelos nomes dos sepultados, vão desde a estela simples até a estatuária monumental e as capelas jazigo de enorme riqueza. Todavia, o distanciamento entre uma e outra, a topografia em aclive, as veredas até o fim da vista e os caminhos curvos arborizados permitem um percurso e uma compreensão de todas as datas, desde os túmulos góticos transladados até o da escultura expressionista de nossos tempos.
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Arquitetura Gótica
"Idade média, és a minha escura subjacência." - Clarice Lispector
     A maioria das pessoas quando houve a palavra "gótico", lembra logo das grandes e célebres catedrais medievais como Chartres, Reims e Notre-Dame de Paris. Mas será que isso teria alguma coisa a ver com as bandas européias de Gothic Rock como Siouxsie & The Banshees, Sisters of Mercy ou Bauhaus? Ao citarmos esta última em particular aí é que a coisa complica, afinal Bauhaus não era também uma escola de arquitetura criada em 1919 e fechada depois pelos nazistas?
     Para encontrar respostas a estas perguntas vamos por partes:
     Como já discutimos em outro tópico sobre a origem do termo gótico, existe sim uma relação com a arte gótica da Idade Média, mas filtrada pela reconstituição cultural que os românticos fizeram incorporando elementos da arte medieval em suas obras, como forma de contestar o classismo e seu apego a antiguidade clássica e ao racionalismo. No romântismo ao contrário havia um retorno idealizado em relação ao místico e ao imaginário medievais (elementos presentes também na arte barroca). E não há ícone melhor da Idade Média que a catedral gótica.
     Neste sentido duas obras românticas são fundamentais: Notre-Dame de Paris de Vitor Hugo, e o Castelo de Otranto de Walpole.
     Na obra de Vitor Hugo, a catedral torna-se o centro de toda a ação. O autor busca no passado histórico o rompimento com a estética clássica, elegendo o feio seu ideal de beleza, fazendo do disforme Quasímodo, o herói da história. Hugo considera ainda em seu romance a arte gótica como a verdadeira arte popular. Quanto a Walpole, é curioso notar que a idéia do romance se originou de um sonho e que posteriormente levou Walpole a construir um castelo gótico, o que acabou se tornando comum a época, em que vários dândis torraram fortunas na construção de castelos góticos medievais em pleno século XVIII.
     O castelo medieval era ainda o cenário privilegiado do roman noir, com seus calabouços, masmorras, fossos, imensas salas, corredores sombrios e passagens secretas. É no castelo, em noites de tempestades e lua cheia que se dá o clímax das gothic novels, como ficou conhecido o gênero.
     São resgatadas do cenário medieval personagens do imaginário cristão e popular, como o vampiro e porque não, Satã.
     O Drácula de Bran Stocker não é nada mais que o lendário conde Vlad Teps da Transilvânia que segundo consta teria vivido no século XVI, e que tanto deliciou a imaginação dos românticos do século XIX.
     Quanto a Satã, Goethe traduziu-o na figura de Mefistófeles, uma das personagens mais marcantes da literatura mundial. Todos os elementos estéticos, muitas vezes grotescos, que se encontram no roman noir ou gothic novel, tem no castelo e na catedral góticos a sua melhor inspiração e representação. E não é nenhum mistério que daí tenha saído a inspiração para 09 entre 10 bandas de Gothic Rock.
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Cinema Gótico
"Quando me perguntam de onde vem minhas idéias, respondo que se originam de meus próprios pesadelos, mesmo quando não estou dormindo.
Temos medo de tudo: do desconhecido, do abismo, da noite, das tempestades, da selva e dos desertos. Na hora de escrever, basta pensar que aquilo
que me assusta provavelmente também assusta os outros. Em algum lugar dentro de nós existe uma chave que acende o medo; é aí onde se instala o
conto de terror, quando está bem escrito, pois o homem sente mais atração por monstros e dragões do que por heróis. Como é impossível estar sempre lutando contra nossos próprios demônios e males, de vez em quando sentimos necessidade de levá-los para passear." - Stephen King.
     A sétima arte está repleta de obras-primas do gênero terror-suspense, filmes que de uma forma ou de outra expressam e exibem a face obscura e irracional da imaginação humana.
     O porquê nos sentimos atraídos e fascinados pelo horror até hoje é um mistério. Os filmes de terror nasceram praticamente junto com a cinematografia. O primeiro filme do gênero surgiu em 1896 e chamava-se Escamotage d'Une Dame Chez Robert Houdin, e em 1912 veio A conquista do pólo no qual um expedicionário era devorado pelo abominável homem das neves. Passando por clássicos como O gabinete do Dr. Caligari de Weine e Nosferatu de Murnau, até o sádico Freddy Krueger nos anos 80, o gênero é um dos mais prolíficos já inventados.
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Literatura Gótica
     Quem pensa que a lista de autores cultados pelos góticos se resume a trilogia Poe-Baudelaire-Byron, está profundamente enganado. No terreno da literatura as influências são as mais variadas possíveis englobando românticos, surrealistas, beatnicks, expressionistas, modernistas, dadaístas e coisas que vão além da nossa imaginação.
     Tudo começou com sir Horace Walpole e seu livro O castelo de Otranto lançado em 1764. Este livro discordava radicalmente dos padrões então vigentes. Sua atmosfera estava repleta de fantasmas, passagens secretas, terrores sobrenaturais e inverossímeis. Estava assim inaugurado o roman noir. O roman noir ou gothic novel, surgido durante o romantismo é mais uma atmosfera literária do que um estilo ou escola propriamente dita. Eis o porque deste gênero espalhar-se por outros estilos literários além do romantismo, rompendo todas as fronteiras da literatura. O conto de terror, o conto fantástico e a ficção científica podem ser considerados seus herdeiros diretos, garantindo ao gênero gótico uma extrema vitalidade até os dias de hoje. Aqui estão portanto citadas as pincipais obras da literatura gótica, romântica,fantástica e de terror. Esta pequena seleção bibliográfica está aberta a sugestões e inclusões. Alguns livros trazem resenha, para vê-la basta clicar sobre o título. É possível igualmente ver a biografia de alguns autores, bastando clicar sobre os nomes. Também fiz questão de incluir autores nacionais que de alguma forma se afinam ou sofrem influência da estética gótica.
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Aldous Huxley, "Admirável Mundo Novo"
Apuleio, "O burro de ouro"
Álvarez de Azevedo, "Noite na Taverna", "Macario"
Ann Radcliffe, "Os castelos de Athlin e Dunbayne", "O italiano", "O confessionários dos penitentes negros"
Anne Ricce, "Entrevista com o vampiro"
Anthony Burgess, "Laranja mecânica"
Arthur conan Doyle, "Um estudo em vermelho" e "O cão dos Baskerville"
Arthur Rimbaud, "Uma temporada no inferno"
Augusto Carvalho Rodriguez dos Anjos, "Eu"
Bram Stoker, "Drácula"
Bryon, "Poesias", "Horas de Ócio", "Don Juan"
Cecília Meireles, "Cânticos", "Crônicas de Viagem" e "Espectros"
Chamisso, Hoffmann, Gogol, Andersen, "Contos dos homens sem sombra" (Coletânia)
Charles Baudelaire, "Flores do mal", "Paraísos Artificiais"
Charles Dickens, "David Copperfield", "O abismo"
Charles Maturin, "Melmoth. O viandante"
Charles Nodier, "Smarra; ou, Os demônios da noite"
Clarice Lispector, "A paixão segundo G.H.", "Perto docoração selvagem", "Laços de família", e todos os outros
Daniel Defoe, "Contos de Fantasmas", "Um diário do ano da peste"
Dante Allighiere, "A divina comédia"
Diderot, "A religiosa"
Donna Tart, "A histó secreta"
Edgar Allan Poe, "O corvo" (poema), "Histórias Extraordinárias"
Emily Bronte, "O morro dos ventos uivantes"
Ernst Theodor Amadeus Hoffmann, "Contos fantásticos", "O pequeno Zacarias chamado Cinábrio", "Contos sinistros", "Irmã Mônica"
Eurípedes, "Medéia"
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Música Gótica
Gothic Music: O lado obscuro do pós-punk.
     No final dos anos 70 e início dos anos 80, a raiva e a agressividde que incendiavam o movimento punk começam a ceder lugar a uma profunda depressão e um sentimento de insatisação de um lado e falta de perspectiva do outro. Na Inglaterra, Margareth Tatcher assume o poder, triplica-se o desemprego e aumenta a inflação. Este é o cenário triste da chamada década perdida.
     Nas paradas musicais domina a pose, o glamour do pop inglês e da dance music com seus artistas poseurs e cintilantes.
     Entretanto algo estava para acontecer em uma cidadezinha chamada Manchester, onde havia muita gente morando em subúrbios cinzentos recusando-se a enterrar o legado punk, e achando que aquele pop poseur tinha muito pouco a ver com a vida real na Inglaterra.
     E é na mesma Manchester que surge o porta voz ideal destes angustiados de quarto, na figura de Ian Curtis, um dos primeiros a transformar toda essa melancolia e desilusão em música, através da sua banda Joy Division, que apesar da curta duração devido ao suicídio de Ian, seu vocalista, deixou como legado o rock mais melancólico e desesperado já feito. Sendo uma das bandas mais representativas do movimento pós-punk, como ficou conhecido este substilo musical do rock, que apresentava elementos musicais do punk mas com uma dose de melancolia mais acentuada. E é dentro do pós-punk que encontramos as mais representativas bandas do chamado estilo gótico, que no Brasil também foi chamado de dark, devido a preferência por roupas pretas de seus adeptos.
     É nos anos 80 que a morte será o tema mais recorrente nas canções pop, sendo igualmente comuns temas como melancolia, desespero, abandono, decepções amorosas e falta de perspectivas. Estes temas estarão presentes nas músicas de um certo grupo suburbano de Crowley, Sussex, Inglaterra; chamado The Cure, cujo vocalista Robert Smith com seu jeito soluçante de cantar, cabelos desgrenhados e olhos pintados de preto, fez a alegria dos cultuadores de "deprê" em canções como One hundred years, The hanging garden e Siamese Twins, atingindo seu climax "noir" no disco Pornography de 1982.
     Entretanto a cristalização do gótico em quanto gênero esteve a cargo de um quarteto de Northampton (Inglaterra), que em seu primeiro single desfia loas a um tal Bela Lugosi, famoso vampiro dos anos 30, e cujo vocalista Peter Murphy delirava pesadelos com sua voz soturna sob um baixo pesadão e efeitos macabros de guitarra; falando de temas como morte, vampiros, morcegos e rituais pagãos.
     A voz igualmente soturna de Andrew Aldritch foi o selo definitivo de movimento gótico, sendo seu grupo, The Sister of Mercy considerado, com toda razão, o maior representante do gênero. Não se pode também esquecer as musas, pra ser mais exato duas musas, madrinhas, divas e rainhas máximas do gótico: Siouxsie Sioux e Anja Howe.
     Comecemos por Siouxsie Sioux, a Bruxa madrinha de uma geração de cabelos arrepiantes, com seu estilo misto de diva dos anos 20 e de prostituta nos seus belos olhos extremamente maquiados. Siouxsie e seus banshees eram majestades únicas do reinado gótico. Guitarras distorcidas, batida tribal, harmonias fluidas e climas mórbidos se traduziam em pérolas como A Kiss in the Dreamhouse, Kaleidoscope e Nocturne. Siouxsie também foi uma das primeiras cantoras a liderar uma banda mais pesada. Nascidos no movimento punk, Siouxsie & The Banshees souberam fazer a perfeita transição para o gótico, sendo um dos precursores do estilo.
     Quanto a sua majestade loira, Anja Howe, a vocalista da banda underground alemã X-Mal Deutschland, pode ser considerada pioneira do estilo gótico na terra de Goethe. Com sua voz inconfundível cheia de alalaôs e anomatopéias, acompanhada de guitarras e baixo linha serra elétrica. Eram também comuns na banda, o uso de recursos eletrônicos, criando sons viajantes que mesclados ao vocal sedutor, criavam texturas delirantes num perfeito clímax lírico-depressivo; levando os mortos vivos à loucura através de obras primas como Incubus Succubus, Tocsin e a maravilhosa Matador.
     Seria ainda uma grande injustiça deixar de citar outras bandas igualmente seminais do estilo Gothic e do Darkwave como Clan of Xymox, The Mission, Opera Multi Steel, Poesie Noire, Cult, Switchblade Symphony, Love is Colder than Death... Bem são tantas que fica até difícil citar todas, em mais uma prova do quanto o estilo é prolífico.
     No finalzinho da segunda metade da década de 1980, porém, o clima começa a tornar-se inóspito para morcegões e afiliados, e o estilo gótico começa a entrar em decadência, significando o fim de muitos grupos que consagraram o gênero, deixando orfãos e famintos de sangue muitos nosferatus, e fazendo as noites enevoadas de Londres (e porque não as noites garoentas de São Paulo) perder muito de seu charme.

Degeneração da degeneração:
     No finalzinho dos anos 90 e começo de 2000, surgem bandas de heavy metal que vêem no rock gótico matéria-prima para uma reciclagem e renovação do estilo. Os adeptos do new-metal como o Cradle of Filth (que se denomina black gothic romantic metal), ou do sub gênero Doom tornam a fazer uma parte dos góticos sorrirem de felicidade, e outra parte virar a cara de desprezo.
     Resta saber quem tem razão, pois só o tempo dirá, se este renascimento do gótico (se é que ele chegou mesmo a morrer), representará a sua volta e consagração, ou se eregirá o seu definitivo epitáfio... ou talvez nenhuma das alternativas anteriores. Contudo uma coisa é certa. Bela Lugosi's still waiting...
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Pintura Gótica
"Beleza é terror. O que chamamos de belo nos faz tremer. A beleza é áspera e se parece com um extermínio. Ainda assim, é tudo que se quer." - Donna Tartt (A história Secreta)
"O horrível é belo, o belo é horrível." - Shakespeare (Macbeth)
     No campo da pintura a influência da arte medieval especialmente do estilo românico e gótico (ao contrário do que foi dito em relação à arquitetura) praticamente não se faz sentir.
     A presença da figura humana extremamente estilizada, o plano bidimensional que caracteriza o estilo, tem muito pouco a ver com os elementos iconográficos reverenciados atualmente pela tribo dark ou gótica. A exceção talvez fique por conta das obras de Giotto, sendo este pintor um dos precursores do rompimento com a tradição bizantina; ao dar um tratamento tridimensional às suas obras.
     Quanto aos elementos simbólicos da arte medieval, de imaginário fortemente místico, este sim traria alguma influência, principalmente no que se refere ao rico bestiário medieval, ilustrado em especial nas iluminuras que costumavam ornar livros e manuscritos da época e também nos elementos decorativos de palácios e igrejas.
     A arte renascentista ao contrário traz uma grande contribuição, presente principalmente nas obras de Hieronymus Bosch, Pieter Bruegel e Dürer. Artistas de apurada técnica e imaginação fértil. O flamengo Bosch demonstra isto muito bem, em sua obra: O jardim das delícias, no triplo painel onde representam-se o paraíso terrestre, o paraíso celestial e o inferno. Uma obra complexa povoada de pequenas figuras e criaturas imaginárias. Bosch seria na concepção de muitos estudiosos da arte, um surrealista antecipado.
     Igualmente há influência estética na Arte Barroca que combinava movimentos energéticos, cores intensas e detalhes decorativos com expressiva originalidade e liberdade. O imaginário barroco é extremamente poderoso, expresso em; gestos, fundos sombreados e uso dramático da luz e sombra. As obras apresentam muitas vezes um caráter sombrio, pungente e dramático.
     Destaca-se neste estilo artistas como Caravaggio, que em suas obras (principalmente as iniciais) celebrou personagens mundanas e sexualmente ambíguas, além de representar figuras religiosas como simples mortais. Um escândalo para a época.
     Outro destaque vai para Jan Vermeer, que possuia uma refinada técnica em trabalhar efeitos de luz e figuras geométricas em seus quadros, como o célebre A rendeira; que tanto excitou a imaginação tresloucada de Dali. Não se pode ainda esquecer um mestre como Rembrandt, que sabia como nenhum outro combinar dramáticos efeitos de luz com sutis efeitos ilusórios, num quase abstracionismo.
     Apesar de todos estes estilos e artistas da pintura terem influenciado na estética dos darks ou góticos, nenhuma desses escolas se compara em importância ao Expressionismo, Surrealismo e Modernismo, todas as artes contestadoras e revolucionárias.
    Comecemos pelo Expressionismo, a arte do instinto, com sua pintura dramática e subjetiva. É um estilo explosivo, errático, que se fez presente também na literatura, no teatro, na dança e no cinema.
     Edvard Munch e Van Gogh podem ser considerados artístas ícones do Expresssionismo.
     Van Gogh é um artista fundamental do gênero, sua obra apresenta uma explosão de cores intensas e puras, e a presença de formas sinuosas que expressam a energia e a dramaticidade de uma alma atormentada.
     O norueguês Edvard Munch, considerado um dos pintores mais radicais e talentosos de sua geração, demonstrou em obras como O Grito, um trabalho inquietante onde a representação pictórica sucumbe às fortes emoções, a tensão e a ansiedade do desepero. Nesta obra em particular; é como se todo o cenário em volta da personagem participasse da excitação aterradora do grito, expressando toda a angústia envolvida na cena.
     Outra influência importante é Goya, em sua obra rica de representações misógenas e diabólicas, onde aparecem velhas decrépitas e ameaçadoras, além de feiticeiras que veneram o grande Bode e preparam pratos abomináveis.
     Quanto ao Surrealismo, que acima de tudo foi um movimento revolucionário, temos igualmente manifestações não só na pintura, mas também na literatura e no cinema.
     O Surrealismo é uma forma de expressão, instintiva, irracional, cuja arma principal era o escândalo. "Seu objetivo principal não era criar um novo movimento pictórico, literário ou até filosófico, mas sim fazer explodir a sociedade, mudar a vida" - (Buñuel).
     Entre os artistas que mais se destacaram neste movimento na pintura estão: Picasso e Dali.
     Picasso e Dali guardam uma certa semelhança pela fixação que possuiam em relação a mulher (Picasso-Dora Marr, Dali-Gala).
     Picasso soube expressar como ninguém o delírio e a monstruosidade da guerra. Em sua obra mais conhecida, Guernica aparecem rostos hediondos, torturados e abjectos, que são na verdade os próprios rostos da guerra e da desgraça provocada pelos nazistas, e eram eles mesmos que atribuiam a obra do próprio Picasso e de outros artistas surrealistas o título de: artistas degenerados.
     Dali foi um dos artistas mais delirantes de seu tempo, possuindo uma imaginação fértil, obcessiva e irracional. Criador do método paranóico-crítico, de um estilo e vida exibicionista, nem sua fase Avida Dollars foi capaz de ofuscar sua obra. Poderia ainda citar outras obras, artistas e gêneros, mas prefiro deixá-los com esta pequena amostra da influência da pintura na estética dark.

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